quarta-feira, 8 de abril de 2009

MOMENTOS


Acredito que se um homem vivesse a sua vida plenamente, desse forma a cada sentimento, expessão a cada pensamento, realidade a cada sonho, acredito que o mundo beneficiaria de um novo impulso de energia tão intenso que esqueceríamos todas as doenças da época medieval e regressaríamos ao ideal helénico, possivelmente até a algo mais depurado e mais rico do que o ideal helénico. Mas o mais corajoso homem entre nós tem medo de si próprio. A mutilação do selvagem sobrevive tragicamente na autonegação que nos corrompe a vida. Somos castigados pelas nossas renúncias. Cada impulso que tentamos estrangular germina no cérebro e envenena-nos. O corpo peca uma vez, e acaba com o pecado, porque a acção é um modo de expurgação. Nada mais permanece do que a lembrança de um prazer, ou o luxo de um remorso. A única maneira de nos livrarmos de uma tentação é cedermos-lhe. Se lhe resistirmos, a nossa alma adoece com o anseio das coisas que se proibiu, com o desejo daquilo que as suas monstruosas leis tornaram monstruoso e ilegal. Já se disse que os grandes acontecimentos do mundo ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e apenas neste, que ocorrem os grandes pecados do mundo.


Oscar Wilde, in "O Retrato de Dorian Gray"

2 comentários:

JPD disse...

Olá N

Os tempos que correm são difíceis, penosos.

Adoptou-se o politicamente correcto e não há maneira de alterar essa postura.

Quem está disposto a corrigir «o tiro» ou dizer e assumir o que realmente pensa?

Muito poucos.

Escamoteia-se essa dificuldade com um concerto de interesses, etc. e tal.

N disse...

Paula, Obrigada, beijinhos!

JPD, muito sábio o seu comentário. Obrigada!